Ilustração: Lumi Mae
Comentando a Pergunta da Semana
Quase todos que responderam à
enquete da semana acreditam que existe diferença entre amor e paixão. E eu concordo com eles.
Paixão,
amor romântico e amor são sentimentos distintos, embora com frequência
confundidos. A paixão é sem dúvida a que causa mais tormentas. Sua
característica principal é a urgência; é tão invasiva e poderosa que
pode fazer com que sejam ignoradas todas as obrigações habituais.
Perturba
as relações cotidianas, arrancando a pessoa das atividades a que está
acostumada, deixando-a completamente fora do ar. É comum se fazerem
escolhas radicais e muitas vezes penosas — falta-se ao trabalho,
larga-se o emprego, muda-se de cidade, abandona-se a família. O filme
Perdas e danos ilustra bem isso. Um homem que ocupa importante cargo no
governo e feliz com a família dá uma guinada dramática na vida ao se
apaixonar pela noiva do filho.
Para o sociólogo inglês Anthony
Giddens, o amor apaixonado tem sido sempre libertador, mas apenas no
sentido de gerar uma quebra da rotina e do dever. Foi precisamente essa
qualidade que sempre o colocou à parte das instituições existentes. Até
pouco tempo atrás, nunca foi aceito como base para o casamento; ninguém
ousava criar ligações duradouras a partir de um amor apaixonado.
A
paixão é de certa forma um fenômeno universal, mas o amor romântico é
específico do Ocidente. Aproveitou alguns elementos da paixão, se
diferenciando dela em importantes aspectos. Ao contrário da paixão, em
que ninguém consegue raciocinar, o amor romântico prevê uma vida a dois
estável e duradoura.
Geralmente ele está associado ao amor à
primeira vista, ao casamento e à maternidade e também à crença de que o
verdadeiro amor é para sempre. Desde o início se “intuem” as qualidades
da pessoa, e a atração que se sente ocorre na mesma medida em que se
supõe que ela vá tornar completa a vida do outro.
A atração sexual
que se sente no amor romântico é mais tranquila, bem diferente do ardor
sexual enlouquecido, componente importante da paixão. O parceiro é
idealizado e nele se projeta tudo o que se gostaria que ele tivesse.
Como não poderia deixar de ser, esse tipo de amor não resiste ao
cotidiano.
A intimidade impede a permanência das idealizações. Os
homens nunca tiveram problemas para resolver a questão entre o amor
romântico, carinhoso e terno do casamento e a paixão sexual pela amante.
E a vida seguia em frente com o confinamento da sexualidade feminina ao
lar, e a mulher orgulhosa por ser considerada “respeitável”.
Falta
falar do amor sem projeções e idealizações, que existe por si mesmo, só
para amar e ser amado. O que se sente nesse amor? Prazer de estar com o
outro, vontade de dividir nossas questões existenciais, participar de
sua vida e permitir que ele participe da nossa, ser solidário, torcer
pela pessoa, sentir saudades.